domingo, 23 de outubro de 2011

Criolo - Nó na Orelha
*** O dinheiro vem pra confundir o amor ***



Minha namorada (e agora também esposa) nunca colecionou discos, nunca foi fã de bandas e artistas (exceto raras exceções) e nunca deu muita atenção às coisas que eu ouvia. Desde que decidimos morar juntos, e minha coleção de cd´s e vinis teve de obrigatoriamente ocupar um pedaço do nosso espaço, senti uma sutil mudança nisto. Não quer dizer que ela tenha iniciado sua própria coleção, nem que tenha ficado vidrada no Scremadelica do Primal Scream, ou que agora saiba de todas as particularidades do Nevermind. Longe disto.

Voltando um pouco no tempo, no hiato de quando iniciei até quando deixei de escrever no blog (é, isto já faz alguns anos), me lembro que o que me motivou a escrever foi justamente a falta de motivação com a música.

A partir da minha adolescência, comecei a conhecer artistas, essencialmente do gênero conhecido como rock, que influenciaram imensamente a forma como hoje encaro o mundo e as pessoas. Porém, com o passar dos anos e com a chegada de outras primaveras este encanto foi sendo perdido e aquele gosto pela busca árdua de novidades no meio musical foi sendo deixado para trás, ao passo que uma atenção maior foi dada aos artistas que eu já conhecia e acompanhava, e que de alguma forma tinham feito parte da minha formação. O meu desapego pelas novidades do rock foi grande, tanto que a última artista que realmente me tocou, embora tivesse atitude rock´n roll, bebia mesmo (sem trocadilhos) era na fonte da soul e do blues, e que como vocês bem devem saber, infelizmente teve sua carreira interrompida aos 27 anos, como muitos outros ídolos da música.

Realmente o mundo é pequeno.

Estive um dia, há muitos anos, na casa de um colega de um amigo meu, que pretendia ser produtor musical. À época ele nos mostrou alguns ensaios de um grupo de rap chamadoPentágono (assim como eu, da Zona Sul de São Paulo), que ficaria conhecido algum tempo depois, concorrendo como melhor vídeo clipe de rap em uma premiação da MTV, e também mostrou uma música que tinha os versos "Tô pra ver um daqui sucumbir", referindo-se as pessoas daquela região, que apesar das adversidades vividas, não sucumbiriam a um caminho mais curto. Não me recordo se não fui informado sobre quem cantava aquele som, ou se realmente não dei muita atenção, porém esta lembrança veio como um flash quando ouvi a música novamente. Enfim descobri quem era.

Esta música era do primeiro disco de um cara que até então assinava como Criolo Doido, e hoje assina apenas Criolo. Este cara foi o responsável por mais uma vez me fazer ter vontade de ouvir um disco por 10 vezes seguidas, de ler sua ficha técnica, conhecer sua história. O álbum a que me refiro, seu segundo trabalho, "Nó na orelha", mistura afrobeat, rap, reggae, samba, bolero e afins, e trouxe um sabor de novidade aos meus ouvidos, destes que fazem qualquer sinestesia parecer normal, e às vezes até nos faz perder os sentidos.

O disco tem a produção impecável de Daniel Ganjaman e Marcelo Cabral, e letras que conseguem, de maneira inteligente e sutil, descrever poeticamente temas cotidianos. Apresenta alguns motes que somente quem é da periferia consegue entender. Só quem já zoou com cachorros nas ruas (pex, pex!!! ), e quem conhece padarias que não vendem pão, vai perceber estes detalhes que se assemelham às expressões paulistanas de Adoniran Barbosa, com uma abrangência incrível.

Na contramão das descrições da cidade de São Paulo feita pelos demais grupos de rap, com seus relatos de violência policial, homicídios e rebeliões, Criolo conseguiu com a maestria de um Cartola dizer isto de uma forma muito mais lírica: "Não existe amor em SP". É óbvio que alguns criticaram negativamente, e muitos elogiaram, mas ninguém ficou inerte. Sempre haverão discussões do tipo: "Ah, mas o Criolo nem é tudo isto, este disco é bem mais ou menos". Eu, particularmente, não tenho mais paciência para este tipo de discórdia. Me importa muito mais o quanto as coisas me tocam e o quanto me parecem sinceras. Muitas das últimas ditas "salvações da música" ou "next big thing" como gostam de dizer na gringa (e olha que aparece pelo menos 1 por mês), não me fizeram esboçar um sorriso sequer, então, ainda prefiro ouvir as críticas dos meus ouvidos e meu coração a me prender a conceitos estéticos, pré-conceitos ou críticas especializadas.

Voltando. Realmente o mundo é pequeno: quem diria que uma música que eu ouvi precariamente gravada em um computador na casa de uma pessoa onde estive apenas uma vez na vida seria de um cantor tão sincero e honesto com o que faz, vindo do Grajaú, no extremo sul da Zona Sul de São Paulo, e que reacenderia a minha paixão (cada vez mais rara) por algo novo no mundo da música?

Esta sinceridade é tão transparente nas canções que até mesmo uma pessoa que não é fã de música, não coleciona discos e não dava muita atenção para as músicas que eu gostava também levou este "Nó na orelha", e ouve com tanta assiduidade quanto eu, entendeu todas as letras, descobriu a história e sentiu, pela primeira vez, aquele prazer indescritível de colocar um ótimo disco para ouvir e acompanhar cantando num sábado de manhã, aguardando para ver um show e esperando o próximo lançamento.

Muito mais do que um disco sincero para ouvir, Criolo e seu "Nó na orelha" fizeram com que agora minha companheira tenha interesse em saber o que escuto, se interesse mais pela história da música, divida suas opiniões e percepções com detalhes que muitas vezes só uma visão feminina consegue ver, queira saber os porquês e os “comos”, o que nos imerge muitas vezes em debates de temas mais amplos sobre indústria, mídia, comportamento e relacionamento humano, enriquecendo ainda mais uma relação já rica. Acredito que seja este tipo de debate que o Criolo e qualquer artista sincero almeja que aconteça.

"Nó na orelha" não tem grandes pretensões, não quer salvar o mundo, nem tampouco quer ser "a salvação da música", mas só por ter a oportunidade de ouvi-lo, de ter vontade de apertar o botão repeat do meu player de música, de escrever no blog novamente e dividir minhas impressões com meus pares, já me sinto em Pasárgada, já sou amigo do rei.

quinta-feira, 19 de junho de 2008

Jorge Ben - A Tábua de Esmeralda
***Até eu...***


Não, não sou roqueiro! Esta foi a resposta mais usada na maior parte do meu período de adolescente, quando questionado a respeito do meu gosto musical. O fato de eu usar camisetas de algumas bandas e possuir uma coleção de discos formada majoritariamente por discos de grupos e cantores do chamado rock, não significa que eu seja roqueiro. Ou significa? Não, não significa! Se fosse assim, a capital de São Paulo seria a cidade com maior concentração de surfistas do Brasil, dada a absurda quantidade de pessoas que se trajam de marcas como Sun Rocha e Belmacut.

Para ajudar a desmistificar o fato de eu não ser um roqueiro, mas sim uma pessoa que gosta de música que soe bem aos ouvidos, hoje resolvi escrever sobre um disco e sobre um artista que de rock não tem “quase” nada.

Jorge Ben iniciou cedo sua vida com a música. Li recentemente na biografia do cantor Tim Maia uma passagem em que ele, Tim Maia, na época apenas um gordinho desajeitado, cantando com voz grave, enrolando no inglês e sabendo apenas dois ou três acordes de violão, foi intimidado por Jorge Ben diante de seus amigos e de algumas garotas, pelo fato de Jorge ser imponente, já possuir uma certa malemolência e senso rítmico com o violão, características estas que podem ser facilmente ouvidas logo nos primeiros lançamentos do Ben. Seu disco de estréia, Samba Esquema Novo (1963), mistura samba, funk, maracatu, bossa nova, tudo ao seu jeito, é claro. Diz a lenda que tanto a batida quanto a afinação do violão de Jorge Ben nunca puderam ser copiados por ninguém, talvez, só por ele mesmo.

Após sua estréia, Jorge Ben lançou vários discos de importância, como O Bidú – Silêncio no Blooklin (1967) e Força Bruta (1970), mas em 1974 lançou um disco seminal para a minha vida, e ainda mais seminal para a música popular brasileira: A Tábua de Esmeralda. O disco pode ser considerado experimental e psicodélico, tanto por músicas longas com diversas orquestrações, como pelas letras sobre alquimia, esoterismo, viagens astrais e outros motes.

Os Alquimistas Estão Chegando abre o disco, com sua batida de violão contagiante, em cuja letra Jorge Ben descreve a atividade dos homenageados no título, mostrando que a eles sobra o que nos falta nos dias atuais. “...eles são discretos e silenciosos...”, “...escolhem com carinho a hora e o tempo do seu precioso trabalho...”, “evitam qualquer relação com pessoas de temperamento sórdido...”. É, ainda nos falta muito.

Jorge Ben nunca foi um artista conhecido por suas letras, mas sim pela facilidade em unir ritmos em gingas desconcertantes, porém, neste disco ele conseguiu, além de tudo, criar letras horas simples, horas complexas ou viajantes, em favor do conceito o trabalho. A simplicidade de O Homem da Gravata Florida, Zumbi e O Namorado da Viúva, se contrapõem com Errare Humanum Est e Hermes Trimegisto e Sua Celeste Tábua de Esmeraldas. Também tem Brother, uma espécie de mantra cantando em inglês, e além de um punhado de outras belas canções capazes de fazer o chão de qualquer festa sem graça tremer devido às danças dos pares.

O disco fecha com Cinco Minutos, música que seguindo o modo simples de composição Beniano, nos ensina a importância da tolerância e paciência.

E eu, acostumado a procurar sentido político em quase tudo o que ouvia até então, com este disco percebi que por mais político que fosse, não fazia sentido se não houvesse verdade, e para Jorge Ben, tudo o que foi dito n’A Tábua de Esmeralda está correto, quer queiramos, quer não. Talvez por isso este seja o melhor disco de um dos mais importantes artistas brasileiros, e talvez por isso seja um dos discos que mais ouço até hoje, e nunca deixou de me acompanhar em minhas viagens, pois é um disco alegre, urbano, praieiro e dançante.

Mesmo após mais de 30 anos de seu lançamento, a sutileza complexa deste disco não pôde ser superada.

Jorge Ben tornou-se alquimista: transformou música em ouro.


Conheça Mais Sobre o Artista:

http://www.jorgeben.com.br/


terça-feira, 25 de março de 2008

Jazzblaster - Isto Não é Um Disco de Jazz
****As mais circenses ilusões...***


Sofri por noites da minha vida em casas de shows, e os causadores deste sofrimento foram os menos óbvios. Nem a distância a percorrer da minha residência até o centro da cidade, onde as casas estão localizadas, nem ter de voltar em sábados ou domingos em coletivos lotados me desanimavam. O problema mor era que, para que eu pudesse assistir ao show desejado, da banda que gostava, tinha de esperar uma série de bandas medianas. E não eram poucas! Chegava-se ao absurdo número de 3 bandas de abertura por noite. É claro que dentro do cenário da música alternativa há sempre bandas mais conhecidas que convidam outras menos conhecidas para abrirem o espetáculo. Mas confesso que nestas noites, amaldiçoava Kurt Cobain e o Nirvana por terem lançado o disco Bleach, a demo mais vendido do mundo, que fez com que todo garoto ou garota acreditasse que era fácil criar uma banda. Eu também me enveredei em ter banda, mas um dia percebi que não era tão simples assim. Apenas empunhar uma guitarra e criar acordes dissonantes não era suficiente para ser uma banda sobressalente. Era preciso talento. Entretanto, esta é outra história que um dia contarei.

Todo este imbróglio serve para dizer que muitas bandas surgem com o intuito de fazer a diferença, mas poucas conseguem se tornar únicas.

Em meio a toda a confusa cena de música alternativa paulistana, surge uma alternativa de fato às incessantes horas de espera pelas bandas head-liners. Jazzblaster é seu nome.

Formada em 2005, a banda já foi quarteto e hoje é um trio. Já teve em sua formação, outros dois bateristas (Ricardo Sartori e Rodrigo Araújo), além de outro baixista (Martim Batista, que atualmente toca na Zefirina Bomba). Após algumas mudanças de formação, a banda se estabeleceu com Pablo Lopes (bateria), Nani Lemos (baixo/guitarra), Vini F. (baixo/guitarras e vocais). Tem influência de guitar bands dos 90´s (Pavement, Superchunk, Elastica e Weezer, só para ficar em alguns nomes) e delas, trás o que há de melhor: melodias trabalhadas, criadas pela versátil cozinha da banda.

As letras, em português, consagram Vini F., principal letrista da banda, como o grande compositor que o grande público ainda não conheceu. Vini F. trouxe para o rock´n´roll a sutileza em letras inteligentes, sem soarem "engraçadinhas". São canções repletas de poesia, que nos envolvem em um mundo particular e peculiar.

Outro fato relevante em relação à dinâmica da banda foi o modo como o seu disco de estréia, Isto Não é Um Disco de Jazz (2007) foi lançado. Antes do Pato Fu ter lançado Daqui pro Futuro no formato virtual primeiro que no formato físico, e muito antes do Radiohead ter surpreendido a indústria fonográfica com o lançamento do seu último trabalho, In Rainbows, para download com valores definidos pelo usuário, o Jazzblaster já havia arquitetado o lançamento mais condizente com o forma de distribuição de música atual: No dia 07/07/2007, ao tocar na Toy Lounge, casa de música alternativa de São Paulo, distribuíram gratuitamente as 8 músicas do disco, em formato MP3, para todos que compareceram ao show munidos de seus MP3 Players, Pen Drives e IPods. Forma de lançamento mais moderna, impossível.

Das 8 faixas do disco, destaco algumas para quem quiser se iniciar no trabalho da banda:

Asfixia faz jus ao nome. Cantada em ritmo frenético que mal pode ser acompanhada, faz com que sintamos vontade de gritar a plenos pulmões: “meu sangue jorra cada dia mais, meu sangue pede uns minutos mais”, diz a letra, que também te dá liberdade o suficiente para nunca mais precisar limpar o que sujou.

A música que mais me impressiona é As portas e os Olhos Entreabertos, pelo ritmo suave e límpido, e a letra descritiva de um caso de solidão. “Passava as mãos tirando o pó da velha escrivaninha azul” é uma prévia de versos cativantes.

Ida, última faixa do disco, insere o ouvinte em um universo semelhante ao d´O Processo, de Kafka. Ao iniciar a música assim: “...e só por isso não vou te levar embora daqui”, o compositor faz com que fiquemos sem saber o motivo do abandono e do castigo, tal como Joseph desconhecia o motivo de seu julgamento no livro citado. A letra começa reticente, e cria reticências interpretativas também.

Tive a oportunidade de conferir a banda ao vivo, infelizmente, por apenas uma vez. Como já citado nas primeiras linhas, precisei esperar algumas bandas, que como de costume atualmente, pecam pelo excesso de humor e ainda acreditam que atitude é subir ao palco e falar mal do Caetano Veloso.

Contudo, o Jazzblaster não decepcionou e fez um belo show, mesmo que curto. A banda tem muita energia e carisma, ótimas músicas e ótimas letras, e acima de tudo, originalidade. Nani e Vini se revezam na guitarra e baixo, Pablo toca bateria enquanto canta em uma cover do Weezer, criando uma ambiente intimista, descontraído, e proporcionando um verdadeiro deleite aos olhos e ouvidos. Sinceramente, não entendo como ainda não conseguiram um destaque maior na mídia, especializada ou não, o que faria com que os shows fossem mais freqüentes e a justiça fosse feita.

Há perguntas cujas respostas são indefinidas: Será que existe vida após a morte? Será que existe vida em marte? Será que garagens ainda produzem boas bandas no Brasil?

Se depender do Jazzblaster, ao menos uma destas perguntas já tem resposta.



P.S.: Devido à dificuldade de lançamento do disco em formato físico, em breve a banda o disponibilizará para download em seu site. Não importa se é um disco de jazz ou não. O que importa é que é música de altíssima qualidade, o que é sempre bem-vindo.

Por enquanto, alguns vídeos e músicas podem ser conferidos nos links abaixo:

http://www.jazzblaster.com.br

http://www.myspace.com/thejazzblaster

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sábado, 2 de fevereiro de 2008

Lobão - A Vida é Doce
***As vezes é melhor deixar a onda passar...***



Eu sou o tenebroso, o irmão sem irmão, o abandono, inconsolado, o sol negro da melancolia”: assim começa um dos discos mais importantes que já passaram por estes ouvidos. Achava muito estranho para uma pessoa que não acompanhasse, ou mesmo para quem acompanhou a carreira do cantor desde os anos 80, entender àquele álbum. Era a contramão da contradição do que fazia nos anos anteriores. Nada de rock´n´roll, nada de new wave, nada de pseudo-MPB. Seguiu o caminho oposto ao mainstream e das facilidades radiofônicas, não emplacou hits, numerou os CD´s, vendeu um número de cópias acima do normal para os padrões e reinventou o conceito de música independente no Brasil.
Criou um disco de músicas não-entituladas rock, Nostalgia da Modernidade (por sinal, um dos melhores nomes de disco que já vi), de 1995, um outro de música “eletronizada”, A Noite, de 1998, até chegar a este que é a sua obra máxima (até o momento), A Vida é Doce, de 1999.
Tenho um sério problema em me lembrar quem me apresentou alguns artistas e bandas por ter sido há algum tempo, e na época não devo ter prestado tanta atenção, mas podem continuar me emprestando livros, cd´s, discos e DVD´s que minha memória está melhor, e não apenas não esquecerei, como ainda, devolverei todos.
Deste lembro-me vagamente que foi um amigo que mora na rua de cima até os dias de hoje. O disco vinha encartado em uma revista, que tinha algumas letras e poemas. Ele tinha comprado em uma banca de jornal. CD em banca de jornal? E não era um daqueles de coleções ou de demonstração de jogos para computador? O conceito de distribuição era diferente, e por isso conseguiu sucesso.
A qualidade do disco é incontestável, e somente a falta do pagamento de “jabá” explica porque não alcançou sucesso radiofônico. Algumas faixas me chamaram atenção, mas ainda preferia o material produzido nos anos 80, como todo bom ouvinte de rock nacional FM. Tempos depois adquiri este disco em um Sebo, e nunca mais parei de ouvir. As intenções dos trabalhos anteriores foram mescladas, então as boas letras continuaram lá, junto com guitarras e efeitos eletrônicos. Arrisco até a dizer que é um disco bastante voltado ao trip-hop em seu melhor estilo Portishead. Músicas como Universo Paralelo, Tão Perto, Tão Longe e Mais Uma Vez mostram que efeitos eletrônicos sutis funcionam quando bem empregados. Descobri que a obra produzida pelo artista durante sua fase independente/anos 90 era infinitamente superior ao que produziu enquanto em uma gravadora major.
De todas faixas, as que mais merecem destaque são El Desdichado II pela letra poética e triste, cujos versos iniciais da canção se encontram no princípio do texto. O compositor um dia disse que foi escrita para um amigo que foi assassinado por uma criança de 13 anos, mas nunca soube deste história com mais profundidade. Tem também Tão Menina, descrita como “o hino da criança junkie” e com os versos “suas lágrimas que nunca brotaram inudam sua alma”, e a faixa título, A Vida é Doce, que na minha opinião é a música mais completa feita nos anos 90. A instrumentação orquestrada, misturando o trip-hop do Massive Attack, vocal falado, estilo hip-hop e letra fora de série, com múltiplas interpretações, e que ao final só nos faz sentir vontade de correr e pedir perdão.
O sentimento me persegue sempre que ouço a música A Vida é Doce é uma vontade imensa de chorar, e não é pelo drama ou tristeza da música, é por sua beleza. E enquanto ouço, fico feliz, por saber que ainda sou capaz de chorar diante de uma música do Lobão, um filme de Paul Thomas Anderson e um livro do Saramago, e me alegro em saber que palavras ainda tem um poder que nenhum corretivo apaga e nenhum coração resiste, por mais belas ou horrendas que sejam.

Conheça mais sobre a banda:

http://mtv.uol.com.br/lobao/news

http://www.myspace.com/lobaouniversoparalelo

quarta-feira, 5 de dezembro de 2007

Los Hermanos - Bloco do Eu Sozinho
***Toda Bossa é Nova***


Se no ano de 1999 você não estava surdo, se se importava um mínimo que fosse com música (mesmo que fosse só com as que te incomodavam) e se estava no Brasil, então você deve saber que o fenômeno musical daquele ano foi a música Anna Julia, do primeiro trabalho da banda carioca Los Hermanos.

Para você que estava surdo, que não dava a mínima para música ou que estava fora do país, apenas como parâmetro, Anna Julia seria hoje, nos anos 2000, em termos de popularidade, como aquele funk proibidão da dupla Cidinho e Doca, que ficou conhecida depois do filme Tropa de Elite de José Padilha. Se você está lendo isto em 2017, Anna Julia devia ser equivalente a esta música bizarra surgida no norte do Sri Lanka que está em primeiro lugar no top 10 da sua rádio preferida.

Um primo meu que não era primo sangüíneo, mas sim por imposição, fã de Backstreet Boys, apareceu com o primeiro CD dos Los Hermanos em um dia qualquer do ano de 1999. Claro que fiquei desconfiado. Poxa, ele gostava simultâneamente dos Backstreet Boys e dos Los Hermanos, como é que Los Hermanos poderia ser bom? Não foi minha culpa, eu juro. Foram as circunstâncias. Eu não gostava de Anna Julia, era muito romântica para os meus conceitos políticos da época. Ouvi aquele CD inteiro, achei péssimo. Banda tocando música pesada com letras de amor? Muito estranho. Esqueci o ocorrido.

Alguns poucos anos depois, na verdade não me lembro como e nem através de quem, o segundo CD da banda chegou a mim. Na capa havia o desenho de um boneco esquisito. Título: Bloco do Eu Sozinho. Lançamento: 2001. Deve ter sido adquirido em alguma destas liquidações de loja de departamento, pois naquela época ninguém mais lembrava da banda, que fez relativo sucesso com a música Anna Julia, e desapareceu. Ouvi o disco também. Conclusão: Apenas 2 anos após traumatizantes audições de Anna Julia em auto-falantes de carros, padarias, festivais, escolas, rodas de violão e banheiros, aquela banda não existia mais.

Era uma outra banda. O Bloco do Eu Sozinho é como se a banda Weezer tivesse vindo para o Brasil e ficado isolada em um sítio ouvindo Cartola, Chico Buarque e The Specials para gravar o disco. Tinha alguns skas transgênicos, guitarras arrastadas, sambas adulterados. As letras de amor continuavam lá, sempre, mas desta vez se envolviam mais com as músicas, se completavam.

Foi difícil admitir, mas Los Hermanos tinham lançado um excelente trabalho. Da abertura com Todo Carnaval Tem Seu Fim até o fechamento com Adeus Você são 14 faixas, dentre as quais destaco Retrato para Iaiá que tem um clima havaiano que não sei explicar ao certo, letra simpática e contagiante, e a minha predileta do disco e uma das preferidas compostas nos anos 90, Cadê Teu Suin-?. Esta, além de ter um conjunto de metais excepcionais, ritmo quebrado nada convencional, tem uma letra absurdamente bem construída, onde o final de cada verso é o início do verso seguinte. É uma crítica voraz à indústria fonográfica, que é implacável com aqueles que não têm “padrinhos” no meio musical. Muitos não percebem esta crítica pelo fato da música em si ser muito alegre, lembrando trilha de desenho animado dos tempos não-modernos, mas é a única canção do disco que não fala de amor.

Outras faixas também merecem atenção dobrada, caso de A Flor, Cher Antoine, cantada parte em francês e parte em português, e Veja Bem Meu Bem. Mas exceto Cadê Teu Suin-?, o verdadeiro destaque fica com Adeus Você, porque encerrar um disco dizendo "quero ver você maior, meu bem, pra que minha vida siga a diante" é para poucos.

Depois do Bloco do Eu Sozinho, voltei a ouvir o primeiro CD da banda e percebi que havia muitas coisas boas escondidas ali, mas que precisei de tempo para poder compreender. Os dois álbuns posteriores, Ventura e 4 são ótimos também, mas fazem parte de outra história.

Quem ainda não pôde ver a banda tocando ao vivo, torçam para que eles voltem a fazer shows (estão em recesso), porque mais do que um show onde todos os presentes cantam todas as músicas a plenos pulmões, é uma lavagem de alma em massa a preços populares.

E é claro, não me esquecendo de deixar aqui um pedido: caso a pessoa que me emprestou o Bloco do Eu Sozinho pela primeira vez tenha sido você, me recorde, pois tenho muito a agradecer por você ter aberto meus olhos antes que eles se fechassem sem que eu soubesse do que é feito o samba.

Conheça mais sobre a banda:

sexta-feira, 16 de novembro de 2007

Fellini - Amor Louco
***A Quietude é Quase um Sonho***



Fiquei anos da minha vida à procura de um amor louco. Ouvia muito falar do dito cujo, mas não sabia bem o que era. Diziam que era maravilhoso, que depois dele eu nunca mais seria o mesmo. E eu até acreditava que fosse mesmo verdade, dadas tantas informações que me passavam acerca do assunto.

Fato é que enfim consegui encontrá-lo. Depois de uma busca incessante, pelas mãos de Jair Marcos, guitarrista da banda paulistana Fellini, adquiri meu exemplar do álbum Amor Louco, lançado pela banda em 1989. Mal sabia o "mal" que me faria.

O Fellini é uma das bandas mais inventivas do cenário musical brasileiro. Sua pequena obra, infelizmente não conhecida por muitos, influenciou diversas bandas e músicos dos anos 80 e 90, tanto pela sonoridade que mescla elementos de rock com samba, pós-punk e new wave, quanto pela forma independente como administravam sua carreira. As gravações feitas em 4 canais não ofuscavam o brilho das canções. Amor Louco foi produzido em melhores condições, gravado em 16 canais.

Mas voltemos ao foco. Árdua batalha vencida, o disco estava em minhas mãos. E Chico Buarque Song me fazia a cabeça, me deixava feliz. Eu amo Chico Buarque. Ela acha que ele é um ótimo poeta, mas canta mal pacas. Tudo bem, tudo certo. Mesmo que eu achasse que ele canta mal, talvez ainda assim gostasse. Algumas vezes a voz sobrepõe às palavras, outras, o contrário.

O clima do disco é acústico, clima de lual em volta da fogueira, com arranjos muitas vezes psicoacústicos e letras meticulosamente escritas em sua maioria por Cadão Volpato e Thomas Pappon. Aliás, o Fellini se desdobrou em muitos outros projetos musicais, também não tão conhecidos como deveriam: The Gilbertos, Funziona Senza Vapore, Cadão Volpato, 3 Hombres, todos de imensa poesia um tanto surrealista e hermeticamente pop. Chico Science, expoente-mor da música brasileira dos anos 90, era admirador do Fellini e gravou com a Nação Zumbi a música Criança de Domingo, do projeto Funziona Senza Vapore, no disco Afrociberdelia.

Na realidade, muito mais do que qualquer artista, o que mais me influenciou a procurar conhecer o Fellini foi a coluna 02 Neurônio da folha de São Paulo. As meninas da coluna viviam escrevendo que as mulheres sonhavam em encontrar um pretê (pretendente) que baixasse a tampa do vaso sanitário, que abrisse a porta do carro e que gostasse da banda Fellini.

Aí pensei: Baixar a tampa do vaso eu já baixo, carro ainda não tenho, então vou conhecer o Fellini porque aí minhas chances de conhecer alguém legal irão aumentar. Grandes ilusões.

Desta vez não quero falar sobre as músicas, mas conhecer o Fellini fez a diferença. Por causa do Fellini conheci um monte de outras bandas, descobri o diretor de cinema de onde a banda tirou o nome e conheci um monte de outras pessoas. Prefiro que cada um procure o seu Amor Louco. Assim como na vida, o Amor Louco é raríssimo, então caso você o encontre, agarre com todas as forças. Este Amor Louco que nos faz cantar desafinado, aprender a tocar violão, dormir fora de casa, este é quase impossível de se encontrar.

Existem 2 Amores Loucos. O primeiro é o do disco do Fellini, o outro é aquele que encontramos na obra de Carlos Drummond Andrade. Foi difícil, mas já encontrei os dois.

“Cidade perdida
Joga as cascas pra lá
Só eu e Você e o amor louco

Cidade proibida
Fácil vem, fácil vai
Só eu e Você e o amor louco.”



Conheça mais sobre a banda:
http://www.myspace.com/fellinivive


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quinta-feira, 8 de novembro de 2007

Pato Fu - Daqui Pro Futuro
***A vida é como um gás...**


Poucas bandas no cenário musical brasileiro, e quiçá mundial, podem causar inveja por possuir uma obra irrepreensível. A banda mineira Pato Fu, que lançou seu primeiro trabalho, Rotomusic de Liquidificapum (1993), e no ano de 2007 deu ao mundo Daqui pro Futuro, é uma delas.

Um amigo fez uma observação interessante: as músicas do Pato Fu, além de soarem sempre originais, nunca soam deslocadas. Não é o que vemos acontecer com outras bandas, que ao lançarem um novo disco, temos em muitos casos a impressão de que as músicas são sobras do disco anterior. O Pato Fu está sempre a diante, mas mesmo assim, qualquer canção do álbum Gol de Quem? (1994) poderia estar em Isopor (1999), ou qualquer faixa de Televisão de Cachorro (1998) entraria facilmente em Toda Cura Para Todo Mal (2005). A mesma singularidade das canções acompanha a pluralidade da obra desta que no ano de 2003 foi considerada uma das 10 melhores bandas do mundo pela Revista Time, ao lado de gigantes como U2 e Radiohead.

Daqui pro Futuro segue a mesma linha criativa contínua criada pela banda, mas como um outro amigo observou, este disco está menos para John e mais para Fernanda. O lado experimental da banda deu espaço para harmonias mais simples e enxutas, com os efeitos eletrônicos menos aparentes e Lulu Camargo desenvolvendo um excelente trabalho com pianos e teclados.
Muitos disseram que a banda desacelerou depois do nascimento de Nina, filha de John Ulhoa e Fernanda Takai, e que a banda fez um disco em sua homenagem, o que não é necessariamente verdade. Toda Cura Para Todo Mal, foi completado durante a gestação de Nina, e nem por isso é um disco calmo. O que acontece é que como de costume o Pato Fu se aventurou mais uma vez em criar algo de inusitado em sua obra, e conseguiram, criando muito mais baladas pop do que músicas para pular e dançar.

E realmente o disco abre calmo com 30.000 pés, que já é pra iniciar com espírito de liberdade.

A única canção realmente feita em homenagem à Nina é Mamã Papá, mas os versos “conte sua história pois sua memória pode um dia se apagar” servem para qualquer um de nós, sendo pais, mães, filhos, avós...

A melancolia é mantida em Espero, outra balada a lá Pato Fu, com vocais de John ao fundo.

Cities in Dust, cover do maior sucesso da banda de pós-punk inglesa Siouxsie and The Banshees, presente no disco Tinderbox de 1986, é a homenagem do álbum, já que geralmente o Pato Fu inclui alguma versão de outro artista em seus trabalhos. É uma boa cover, mas não atinge o status de versão por ser bastante parecida com a música original.

Tudo Vai Ficar Bem tem um dueto de Fernanda Takai com Andrea Echeverri, vocalista da banda colombiana Aterciopelados, e é uma das melhores faixas do disco, também por conta das guitarras e bateria um pouco mais pesados.

Como a banda possui inúmeras referências, fizeram uma interpretação bem pessoal em A Hora da Estrela, criando uma ponte entre a busca pela felicidade vivida por Macabéa, do livro homônimo de Clarice Lispector, e a busca por sucesso a qualquer custo.

Tida com um hino gay, Woo! trata de um grito de liberdade muito mais amplo, algo como o antigo sucesso de Raul Seixas que dizia “Faça o que tu queres, há de ser tudo da lei”.

Vem A Verdade Sobre o Tempo, e para entender esta é preciso sentir as palavras: “...a vida é muito mais que os dias, que os deuses, que jornais...”

E ainda tem Quem Não Sou, que pode ser considerada a mais experimental do disco, mas simplesmente pelos efeitos de distorção das vozes, levada minimalista sons menos orgânicos.

Vagalume é uma música daquelas que costumeiramente chamamos de “fofas” e que de hoje em diante será tocada em diversos luais.

A melhor faixa do disco, Nada Original, acerta no título, pois não trás nada de diferente do que o Pato Fu tenha feito até aqui, mas mostra a competência da banda em compor belas canções, com grandes letras e fugindo sempre de temas óbvios.

O disco fecha com 1000 Guilhotinas, mas uma canção light, um clima que mistura futurismo com idade média. É uma boa canção estranha.

Ao final do disco, a impressão que tenho é que o ele remente sempre ao tema de liberdade, seja a liberdade de nascer e morrer, de criar asas e voar, ou até mesmo da falta de liberdade.
Mas o que salta aos olhos e ouvidos é a produção impecável do disco. O projeto gráfico de Conrado Almada é primoroso, e a produção musical mais uma vez assinada por John, mostra que além de ser um dos melhores guitarristas e compositores do país, também consagrou-se com um dos maiores produtores da atualidade, e tem liberdade para fazer o que quiser no estúdio 128japs, que mantém em sua casa, e de onde consegue tirar os timbres mais eficazes de todos os instrumentos.

Não é o melhor trabalho da banda, que sempre mantém a regularidade da qualidade de seus discos, mas é com toda a segurança um dos melhores lançamentos do ano de 2007.

E daqui pro futuro vamos esperar pra ver o que acontece.


Conheça mais sobre a banda:

http://www.patofu.com.br

http://www.myspace.com/patofu


quinta-feira, 1 de novembro de 2007

Autoramas - Teletransporte
***Surte, e daí?***



A banda carioca Autoramas criou em seu mais recente disco – Teletransporte (2007) – um legado de canções que representam as dificuldades e frustrações da sociedade moderna. Dificuldades? Frustrações? –“Lá vem mais um daqueles disquinhos deprês!”.
Muito pelo contrário. Os Autoramas fizeram isto com simplicidade, criatividade e muito bom humor.

Neste disco a formação conta com Gabriel Thomaz (guitarras e vocais), Selma Vieira (baixo e vocais) e Bacalhau (bateria), e têm nas letras sarcásticas e inteligentes do também principal compositor da banda, Gabriel, um dos seus maiores trunfos.

Nos trabalhos anteriores, Stress, Depressão e Síndrome do Pânico (2000), Vida Real (2001) e Nada Pode Parar os Autoramas (2003), o que dava o tom era a mistura surf music + jovem guarda, o que não ocorre em Teletransporte. A produção de Kassin e Berna deixou o disco mais pop, no bom sentido que a palavra carrega. A maioria das músicas poderiam tocar em rádios FM e melhorar a qualidade da programação já escassa de bons grupos, tudo isso, é claro, caso não houvesse a Lei do Jabá. O baixo, que antes era alto e distorcido, agora é mais contido, e a banda muitas vezes soa mais guitar do que surf music. Como eles nunca se nomearam como uma banda de surf, isso não representa efetivamente um problema.

O disco abre com a dobradinha Mundo Moderno e Fazer Acontecer. A primeira com a levada mais rock, e a segunda, com a guitarra fazendo as vezes de um efeito eletrônico. A primeira com a letra reclamando da prisão que a grande quantidade de novidades pode criar, enquanto a segunda versa sobre o poder de se tomar as rédias das situações, o que neste caso, pode servir tanto para alguém que joga o lixo no lugar correto, quanto para um CEO de uma grande corporação, e as milhares de decisões que tem de tomar diariamente.

A 300 Km/h é tida por Gabriel Thomaz como a melhor canção que já compôs. Seu ritmo é calmo, típico de bailes daqueles para dançar de rosto colado. E quem não se rende aos versos “Eu estou a 300Km/h na sua direção, sem freio...”?

Marketeiro é um sátira sobre artistas que se deixam moldar para atender às expectativas do público. Não há nada mais atual do que isso, não é verdade?

Entra em seguida Hotel Cervantes, uma surf music desacelerada sobre amores, urgências e tranqüilidade.

A próxima, Já Cansei de Te Ouvir Falar, com os vocais divididos com a ótima baixista Selma Vieira, também possui uma levada rock, e fala sobre um relacionamento mal resolvido, e da peleja em buscar alguém fora dos padrões convencionais.

Identificação mostra os Autoramas misturando Roberto Carlos com Freud. A música lembra muitas canções da jovem guarda, e a letra, alguém que se conheceu melhor por ter ódio de si, e que se decepciona ao perceber que não é a pessoa que realmente queria ser. Colada em Identificação vem Surtei, pesada e declamando um hino sobre stress.

Conseguem também mostrar que nem só de peso vivo o homem, e Eu Mereço conta a história de alguém que se expôs demais, e juntamente com a próxima, Muito Mais, mostram a superficialidade das relações humanas. E isso acontece de verdade? Claro que não. Big Brothers estão aí para provar o contrário.

Digoró, uma versão de uma banda brasiliense chamada Radical Sem Dó é fora de série. Instrumental esquizofrênico e letra viajante que envolve meninos drogados, um seqüestro de naves de fliperama e explosões. É ficção científica lado b psicótica.

O disco fecha com Panair do Brasil, uma balada instrumental em “homenagem” à crise aérea brasileira, que pode servir para relaxar diante das horas de atraso enfrentadas nos aeroportos, seguida de O Inesperado, com título auto-explicativo, e por último, Guitarrada, outra instrumental em homenagem ao gênero musical paraense que mistura choro, carimbó e jovem guarda.

Enfim, um disco que trata de crises amorosas e aéreas, falta de tempo, medos, stress, exposição pessoal e todas essas mazelas do mundo moderno, mas que no final te deixará feliz e você esquecerá de tudo isso, inclusive do que leu agora.


A banda disponibilizou todos os discos lançados até agora para download gratuito. Faça o download dos discos Stress, Depressão e Síndrome do Pânico, Vida Real, Nada Pode Parar os Autoramas, Teletransporte e algumas raridades no link abaixo:
http://www.tramavirtual.com.br/autoramas

Conheça mais sobre a banda:
http://autoramas.uol.com.br

Comunidade no Orkut com Participação
dos Integrantes da Banda: Entre Aqui

quinta-feira, 25 de outubro de 2007

Nação Zumbi - Fome de Tudo
***Passando por cima de tudo e de todos...***



Desde o lançamento de Radio S.Amb.A, primeiro trabalho da Nação Zumbi na chamada pela mídia “era pós-Chico Science”, datado do ano 2000, até seu mais recente trabalho, Fome de Tudo (2007) vê-se que a banda está chegando ao fim. Se eles continuarem assim, não durarão muito tempo não! Já explico o porquê.

O que se ouve em Fome de Tudo não são 12 novas faixas, mas sim 12 rounds em que o ouvinte sai sempre nocauteado. Selecionaram só o que havia de melhor nos trabalhos anteriores. Um pouco de peso do Rádio S.Amb.A (2000), a psicodelia do Nação Zumbi (2002), a atmosfera eletrônica do Futura (2005), além de resgatar os ótimos timbres dos tambores da época de Chico, tudo isso servindo como “plano de fundo” para as letras sempre sinestésicas de Jorge Du Peixe, que vem se mostrando cada vez mais um exímio compositor.

A banda está enxuta, mais coesa e menos experimental, o que de forma alguma é considerado ruim, muito pelo contrário.

A abertura com Bossa Nostra já mostra a que a Nação Zumbi não veio a passeio e que as alfaias voltaram a gritar como em outrora. O riff de guitarra é bem marcado, explodindo quando menos se espera, e as palavras ninguém quer saber o gosto do sangue, mas o vermelho ainda é a cor que incita a fome soarão na sua cabeça até o fim do disco.

Em seguida tem Infeste com sua bateria suave, guitarra econômica, isso até a segunda página. Em questão de segundos Pupilo desenfrea a espancar a seu kit e um novo riff preciso de Lúcio Maia vem à tona.

Carnaval é literalmente para agitar sua festa. Um afrobeat que deixaria Fela Kuti, o pai do gênero, boquiaberto e batendo o pezinho no chão. Dengue segura o suingue ao lado de Pupilo, mais uma vez ditando o que tem de ser feito.

Sem tempo pra te deixar respirar, sai Carnaval e entra Inferno, com sua pegada dub-psicodélica e a voz macia da cantora Céu sussurrando ao ouvido, te levando a um lugar não muito distante do inferno, e você já começa a ficar com medo: estes caras devem ter feito pacto com o diabo, tal qual a lenda de Robert Johnson, para tocar desta forma.

Nascedouro mostra que a Nação Zumbi não esconde sua influência do samba. Uma das melhores até agora. Arranjo de metais do Mestre Ademir Araújo é um espetáculo a parte. Dá-lhe viver.

Aí entra Onde Tenho Que Ir. Uma das coisas mais espetaculares que ouvi nos últimos anos. Não vou nem ficar descrevendo muito, ouça. É inexplicável.

Assustado tem o perfl das músicas do Toca. A letra é dele em parceria com Du Peixe, mas toca já tem seu estilo próprio de composição. Músicas com influências bem africanas, cheias de percussões e mãos batendo palmas para acompanhar. Mas fique calmo porque maloqueiro não se assombra com qualquer coisa.

A faixa título, Fome de Tudo, vem bem pesada, com tambores e guitarras carregadas, destaque para a letra que diz que a fome te uma saúde de ferro.

Em um dos muito melhores momentos do disco, chega enfim, Toda Surdez Será Castigada, com letra composta por Jorge Du Peixe e Junio Barreto. Psicodélica até a medula, vocais divididos entre os dois compositores, título fazendo referência a Nelson Rodrigues/Arnaldo Jabor. É só fechar os olhos e escutar a música inteira.

A Culpa
é uma as mais parecidas com as músicas do álbum anterior, Futura. Talvez pela mixagem que deixou os tambores uniformes, as guitarras cadenciadas, mas sem peso. Funcionará muito bem ao vivo.

Estamos chegando ao fim, você começa a pedir arrego. Originais do Sonho: aqui temos tambores convivendo em perfeita harmonia com as guitarras e efeitos eletrônicos. No single digital de Bossa Nostra foi incluído um remix do Maquinado, projeto paralelo de Lúcio Maia, que está no mesmo nível da canção original.

Se você conseguiu chegar até aqui, prepara-se. Agora é o golpe de misericórdia. No Olimpo não é uma canção qualquer, é algo tão profundo, mas tão profundo, que se você não chorou até agora e não chorar aqui, pode ficar tranqüilo porque não irá chorar na sua formatura da faculdade, nem quando a Seleção Brasileira for hexa e tão pouco no nascimento do primeiro filho. São menos de 5 minutos para te destruir. Começa com a percussão de Toca Ogan em sincronia com a guitarra de Lúcio e vai até o final apoteótico que com certeza te lembrará de uma tal A Day In The Life de uma bandinha inglesa não muito importante.

A sensação é que o fim está próximo, ou que não existe limites para nada. Com produção de Mário Caldato Jr., cometeram um dos melhores discos feitos no Brasil em algumas décadas e será difícil superá-lo. É, acho que o fim está realmente próximo.

E agora você está sangrando no ring, é hora de jogar a toalha.


Conheça mais sobre a banda:

www.nacaozumbi.com.br/


http://www.myspace.com/nacaozumbi